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Mercados de carbono: qual a diferença entre o regulado e o voluntário?

Escrito por Mariana Nunes e Branca Americano

Os mercados regulados de carbono estão vinculados a uma obrigação regulatória estabelecida por um governo ou entidade jurisdicional. Eles podem ser nacionais, regionais, estaduais ou provinciais, dependendo do escopo da regulamentação.

Existem dois principais modelos de precificação do carbono dentro do mercado regulado:

  • Taxação do Carbono – O governo define um preço fixo por tonelada de CO₂ emitida, sem um sistema de comércio de emissões.
  • Sistema “Cap-and-Trade” – Um limite máximo de emissões (cap) é estabelecido, e as empresas podem comprar e vender permissões de emissão dentro desse limite.

Nos mercados de cap-and-trade, as permissões de emissão podem ser distribuídas gratuitamente ou por meio de leilões, que geram arrecadação para o Estado. Já na tributação de carbono, não há venda de unidades, apenas a aplicação de uma taxa sobre as emissões. Além disso, alguns sistemas são híbridos, combinando os dois modelos, ou conectados, como os mercados de Quebec e Califórnia, e o Sistema Europeu de Comércio de Emissões (EU ETS) e o ETS da Suíça.

Atualmente, cerca de 25% das emissões globais estão cobertas por algum tipo de cap-and-trade ou tributação de carbono.

Mercado Regulado internacional

O Protocolo de Quioto (1997) criou um mercado regulado com metas mandatórias de redução para os países desenvolvidos. Para flexibilizar essas metas, foi criado o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), que permitia a compra de créditos de carbono (offsets) gerados em projetos de países em desenvolvimento, que dessa forma contribuía para a redução de emissões sem ter obrigações nessa fase inicial do regime climático internacional.

O Acordo de Paris, por meio do Artigo 6, estabelece mecanismos de mercado para incentivar a redução global de emissões de gases de efeito estufa de forma eficiente. O Artigo 6.2 permite que países negociem Resultados de Mitigação Internacionalmente Transferido/ Internationally Transferred Mitigation Outcomes (ITMOs), possibilitando a cooperação entre nações para atingir suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs). Já o Artigo 6.4 cria um novo mecanismo de créditos de carbono, sucessor do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), permitindo que projetos de mitigação gerem créditos que podem ser comercializados por países e entidades privadas. Além deisses, o Artigo 6.8 prevê um mecanismo de não mercado, voltado para cooperação internacional sem a necessidade de transações de créditos de carbono.

Outra iniciativa relevante é o CORSIA (Carbon Offsetting and Reduction Scheme for International Aviation), regulamentado pela Organização Internacional de Aviação Civil (ICAO). Esse sistema exige que empresas de aviação compensem suas emissões por meio da compra de créditos de carbono, garantindo que o crescimento do setor aéreo não resulte em um aumento líquido das emissões globais. Como as emissões do transporte internacional não são atribuídas a nenhum país, devido à dificuldade de estabelecer a alocação entre diferentes jurisdições, o CORSIA foi concebido para lidar com essa lacuna, estabelecendo um mecanismo global para a mitigação do impacto climático da aviação.

O Mercado Regulado no Brasil

O Brasil após muitos anos de discussão estabeleceu em dezembro de 2024 o seu mercado regulado de carbono por meio da Lei nº 15.042/2024, criando o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE). Esse mercado funcionará no modelo cap-and-trade, estabelecendo limites obrigatórios de emissões para setores intensivos em carbono e permitindo a negociação de permissões de emissão entre os agentes regulados.

Além disso, a lei prevê a criação do Registro Nacional de Emissões e Reduções de Emissões de Gases de Efeito Estufa, que será a base oficial para o controle das permissões e créditos de carbono transacionados. Esse registro garantirá transparência, rastreabilidade e integridade ambiental, evitando fraudes como a dupla contagem e alinhando o Brasil a padrões internacionais.

A regulamentação detalhada do SBCE será definida pelo governo nos próximos meses, mas a expectativa é que o sistema incentive a descarbonização da economia, promova a competitividade das empresas brasileiras no mercado global e contribua para o cumprimento das metas da NDC do Brasil no âmbito do Acordo de Paris. O SBCE também prevê mecanismos de integração com mercados internacionais, fortalecendo a posição do Brasil no sistema global de precificação do carbono.

O Mercado Voluntário de carbono

Diferente dos mercados regulados, no mercado voluntário a motivação para a compra de créditos de carbono vem da sinalização de clientes, consumidores e investidores, sem imposições legais. Empresas, instituições e indivíduos que não estão sujeitos a um ETS (Sistema de Comércio de Emissões) ou taxação de carbono buscam reduzir ou compensar suas emissões para atingir metas voluntárias de neutralidade de carbono ou compromissos de sustentabilidade corporativa (ESG).

Os geradores de créditos de carbono são projetos que sequestram, evitam ou reduzem emissões de gases de efeito estufa (GEE), seguindo padrões internacionais de certificação, como o MDL (Mecanismo de Desenvolvimento Limpo) ou certificações independentes (Verra, Gold Standard, ART-TREES, entre outros). Esses projetos devem ser auditados e atender a critérios rigorosos de boas práticas, garantindo adicionalidade, mensurabilidade e permanência. Além do benefício climático, muitos projetos geram co-benefícios socioambientais, como proteção de habitats, geração de emprego e melhorias na qualidade de vida das comunidades envolvidas.

Embora a venda de créditos de carbono seja uma estratégia para reduzir emissões, ela não substitui a necessidade de ações concretas de mitigação, como substituição de tecnologias, eficiência energética, mudança de combustíveis e alteração de hábitos de consumo. Existe um debate crescente sobre o uso dos créditos de carbono apenas para compensação de emissões residuais, ou seja, aquelas que não podem ser reduzidas por barreiras técnicas ou econômicas.

Para que um crédito seja contabilizado como compensação, ele precisa ser aposentado (cancelado em um registro oficial), impedindo sua revenda. As transações no mercado voluntário são bilaterais, sem a atuação de um órgão regulador central, o que torna as negociações mais flexíveis e menos burocráticas. No entanto, o setor ainda enfrenta desafios como falta de padronização, transparência e mecanismos robustos de precificação. Isso traz riscos tanto para vendedores, devido aos custos elevados de certificação, quanto para compradores, que precisam garantir que os offsets adquiridos sejam de alta qualidade, auditados e sem risco de dupla contagem.

Existem esforços para solucionar os obstáculos de crescimento deste mercado, liderados por instituições como a CDP (Carbon Disclosure Project), ICAP (International Carbon Action Partnership) e TSVCM (Taskforce on Scaling Voluntary Carbon Markets). O Banco Mundial também lança anualmente um relatório sobre precificação de carbono chamado State and Trends Carbon Pricing.

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